Reforma administrativa valerá para atuais servidores e acabará com férias de 60 dias, diz deputado
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19 de agosto, 2025
Grupo vai propor 70 mudanças nas carreiras, concurso, supersalários e pagamento de bônus
A proposta de reforma administrativa que será apresentada nesta semana atingirá inclusive os atuais servidores públicos, segundo o coordenador do grupo de trabalho da Câmara, o deputado Pedro Paulo (PSD-RJ). Entre os pontos que terão validade imediata está o fim das férias de 60 dias por ano para juízes e promotores.
“É o que foi consenso no grupo e está na proposta. Agora, vamos para a discussão. A pressão [contrária] é grande”, disse o parlamentar ao C-Level Entrevista, videocast semanal da Folha.
A aplicação das novas regras sobre os atuais servidores quebraria um tabu da reforma anterior, tentada no governo Jair Bolsonaro (PL), que tinha alterações apenas para quem entrasse no serviço público após sua aprovação –o que nunca chegou a ocorrer.
O grupo de trabalho vai propor cerca de 70 medidas para melhorar a eficiência e gestão do serviço público, incluindo regras para avaliação de desempenho, bônus de eficiência, progressão de carreira e concursos públicos.
A expectativa do parlamentar é debater o tema com os partidos e alinhar os textos para aprovar em setembro.
Quais são os pontos principais da proposta de reforma administrativa?
É um conjunto de praticamente 70 propostas que estamos apresentando, divididas em quatro grandes eixos. Um eixo de governança, gestão e estratégia; um eixo de RH [recursos humanos] público, que trata da melhoria da produtividade do serviço público; uma parte de transformação digital; e um quarto eixo, que talvez seja um eixo mais polêmico, que é a questão dos privilégios no serviço público.
Todo chefe de governo eleito terá 180 dias para um planejamento estratégico, com metas claras e indicadores que perseguirá nos quatro anos [de governo]. O cidadão é o principal cliente dessa reforma.
O que a reforma traz em relação a supersalários e privilégios?
A questão dos privilégios no serviço público está todos os dias nos jornais. Tem gerado uma indignação profunda na sociedade, e esses privilégios estão nos três Poderes.
Ainda que a correção desses abusos não esteja diretamente vinculada a um melhor resultado na ponta de serviços públicos, ela tem um aspecto pedagógico. É quase uma questão de vergonha na cara nós corrigirmos essa situação
Uma carreira exclusiva dos juízes dispõe de um privilégio que é 60 dias de férias mais recesso, quando todo trabalhador no Brasil tem só 30 dias de férias. E esses 60 dias de férias praticamente nunca são gozados, são transformados em pecúnia, são vendidos.
O sr. vai acabar com as férias de 60 dias no projeto?
Nós vamos propor que as férias de todos os servidores públicos sigam a mesma regra. A mesma regra no tempo, 30 dias, e que elas sejam impedidas de se transformar em pecúnia e pagos com retroatividade
O projeto dos supersalários aprovado na Câmara tinha muitas exceções, em torno de 30. Quantas exceções haverá no projeto agora?
O que vamos fazer é apertar os critérios para se definir o que é verba indenizatória e remuneratória. A gente vai ter um texto bastante restrito. Não vai dizer o que é exceção, vamos balizar os critérios e com certeza não haverá a possibilidade de ter aquelas exceções como aconteceu na votação da Câmara.
[Essas verbas] têm que ser aprovadas em lei, e não podem simplesmente ser definidas e criadas ao sabor do Poder Judiciário, do Poder Legislativo, enfim, elas vão ter que ser instituídas em legislação.
Vai haver uma mudança de regra sobre a demissão dos servidores ou a criação de novos regimes?
Tenho absoluta convicção de que a estabilidade é mais do que um direito do servidor público, é um direito de todos nós cidadãos. A gente tem carreiras que são tipicamente de Estado, em que a estabilidade é uma proteção do Estado e uma garantia para todos nós. Então isso é uma premissa que nós levamos na reforma administrativa, nós não vamos acabar com a estabilidade.
O que nós estamos fazendo é, por exemplo, definir os critérios para avaliação de desempenho. Estamos colocando a avaliação individual como um critério definidor da progressão da carreira do servidor.
Ainda que eu tenha essa absoluta convicção de que a estabilidade para alguns segmentos é fundamental, para outros a contratação temporária é necessária. Ela é necessária, por exemplo, para você cobrir vacância de professores em determinadas áreas, para você poder cobrir atividades que tem caráter extraordinariamente temporário.
No caso das regras de demissão não vai haver mudança, mas no estágio probatório a avaliação de desempenho vai disciplinar as regras de permanência e também a progressão de carreira?
Nós vamos dar na reforma as balizas do que seria uma avaliação de desempenho adequada. O Ministério da Gestão criou um sistema de avaliação de desempenho. Nós estamos trazendo como lei federal para que seja seguido em todos os Poderes, em todos os entes.
O sr. pode detalhar como se dará a contratação temporária?
Em primeiro lugar, um tempo máximo de cinco anos e uma quarentena de recontratação temporária de 12 meses. Vamos comandar em lei que o governo federal possa fazer um cadastro nacional de contratos temporários para que muitos municípios, que não têm condições de fazer esse processo seletivo, possam ter um banco de contratos temporários.
Nós vamos exigir a [previsão do direito à] licença maternidade, do terço [adicional no pagamento de férias], quando esse contrato temporário passar de um ano. Algumas dessas garantias para os contratados temporariamente são regras que nós estamos tornando nacionais para que se possa [ter] direitos mínimos para esses contratados.
Como funcionaria a quarentena?
Vou dar um exemplo: algumas cidades e estados fazem contratações temporárias de professores por nove meses. Durante nove meses, [enquanto ocorrem] as aulas dos alunos da rede pública, tem a contratação temporária.
Quando acaba o ano letivo e entram as férias, esses professores e professoras contratados temporariamente são dispensadas do contrato e depois recontratados em fevereiro, no início do ano letivo. Isso tudo para se desviar do pagamento de férias.
O que estamos fazendo é colocando essa quarentena para que para que, na medida em que se recontrate, você pague esses direitos. Para que não haja esse subterfúgio de contratações para dispensar pagamento de férias e outros direitos.
Como vai funcionar a avaliação de desempenho? Como será a definição de metas de cada setor e, principalmente, como vai se evitar o que está acontecendo no governo federal, em que o bônus é devido até a quem está aposentado?
Uma coisa é a avaliação de desempenho, que será individual. Cada servidor tem a sua avaliação de desempenho anualmente, de todo o seu período como servidor público.
Essa avaliação de desempenho passará a compor também um plano de evolução da carreira do servidor. [Não será] só mais por tempo de serviço o critério de evolução na carreira.
Quem tiver uma avaliação de desempenho positiva vai ter preferência na progressão para os cargos de chefia?
Todas as carreiras vão ter que ter 20 níveis, no mínimo, para progredir, para se progredir um servidor. Vamos dizer na reforma que o tempo de serviço não será mais o [único] elemento para a progressão. O elemento para a progressão também vai ser a avaliação de desempenho daquele servidor individualmente.
E quem vai ter direito ao bônus por desempenho?
É muito importante a gente entender a separação do que é a avaliação de desempenho individual e suas consequências na carreira do servidor, e o que é o bônus de resultado, planejamento estratégico, a meritocracia, que é um outro capítulo da reforma administrativa.
Nós vamos permitir que os governos possam dispor de uma 14ª folha, se tiver saúde fiscal para isso, para que ele possa pagar esses bônus. Esse bônus está vinculado ao resultado de um órgão, de uma secretaria, de um ministério.
Os que não vão poder receber o bônus são os agentes políticos –deputado, vereador, governador, prefeito. E não vai poder pagar um valor igual para todo mundo, ter distribuição linear. Nós estamos trazendo um plano de meritocracia que tem que valer para todo mundo, menos, obviamente, os agentes políticos.
Houve uma mudança prática nas regras de trabalho à distância no serviço público desde a pandemia. Segundo a proposta de vocês, como essas regras devem ser encaradas?
O teletrabalho gerou possibilidade de continuidade de atividade no setor privado e no setor público, mas, para o setor público, em determinadas órgãos, virou um abuso. Existem agências reguladoras que estão ainda desde a pandemia 100% em teletrabalho. Isso não pode ser admitido.
Nós vamos disciplinar o teletrabalho, tornando ele uma exceção, não uma regra. Por exemplo, limitar o teletrabalho a um dia na semana. Isso não vai ser absoluto. Se um órgão quiser permitir mais servidores em teletrabalho, que ele justifique de forma transparente e com responsabilidade o teletrabalho
A gente também teve o cuidado de apertar as regras do teletrabalho, mas respeitar, por exemplo, pessoas que necessariamente estarem em teletrabalho por uma condição física ou por uma condição familiar especial.
O sr. já disse que poderá colocar no texto, na parte de concursos públicos, que quem está disputando um cargo poderá entrar diretamente em um nível mais alto da carreira. Isso vai entrar na proposta?
Sim. Na medida que em estamos tornando obrigatório que cada carreira tenha no mínimo 20 níveis, vamos permitir que para determinadas carreiras, em caráter extraordinário, você possa ter um concurso intranível. Também vamos colocar um percentual para que os salários iniciais das carreiras sejam no máximo 50% do salário final das carreiras.
A reforma vai regulamentar greve no serviço público? Estabelecer um percentual mínimo de servidores que podem estar de greve, por exemplo?
A ministra Esther [Dweck, da Gestão e Inovação, pediu] a mim e ao grupo de trabalho que a gente não tratasse desse tema, porque é algo que o governo federal tem feito. O governo federal, segundo me disse a ministra Esther, encaminhará para o Parlamento, nos próximos meses, alguma lei para estabelecer critérios para negociação coletiva, greve.
Há um cálculo de quanto a reforma administrativa pode economizar em termos de gastos públicos? Com a discussão dos bônus, não se corre risco da reforma acabar aumentando as despesas?
Não tem meta de redução de despesa. Nós não conseguiremos, nos quatro anos desse governo, reequilibrar as contas da União. Então, assim, por não ter essa agenda fiscal concluída, se atribui à reforma administrativa essa tarefa de reequilibrar as contas.
Eu não consigo determinar esse montante de economia. O que eu posso afirmar é que, no médio prazo e no longo prazo, os efeitos de todas as propostas que estão na reforma vão permitir uma redução da despesa, uma racionalização dos custos.
Na questão dos municípios que são dependentes de receita, que não tem receita própria maior do que a receita transferida [por estados e pela União], esses municípios vão ter uma limitação no número de secretários e no salário dos seus secretários, assim como existe, por exemplo, a limitação do salário e do número de vereadores nas câmaras municipais.
Qual vai ser a limitação?
O município de até 30 mil habitantes, ele pode ter até nove vereadores, e o salário do vereador tem que ser 20% do salário do deputado estadual. Esse município vai ter um número máximo de secretarias, se não me engano são nove também, e esse percentual do valor do secretário também será 20% do salário do deputado estadual.
Qual é o calendário para votar a proposta?
Eu tenho muita expectativa que a gente possa concluir essas discussões em agosto, e em setembro estar pronta a reforma administrativa para se deliberar em plenário. Primeiro a PEC [proposta de emenda à Constituição], na sequência o PLP [projeto de lei complementar] e o PL [projeto de lei].
As medidas, como o fim dos 60 dias de férias, valem para quem já está na ativa ou essas questões são todas para quem tá entrando agora?
Nós estamos tratando para quem já está. É o que foi consenso no grupo e está na proposta. Agora vamos para a discussão, vamos para o campo. Você sabe que a pressão é grande.
Fonte: Folha de São Paulo