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Regime Jurídico Único: Emenda à Constituição e quórum para aprovação

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08 de outubro, 2020

O Plenário iniciou julgamento de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada em face da Emenda Constitucional (EC) 19/1998, na parte em que alterou a redação do caput e dos incisos X e XIII do art. 37 (1); do caput e dos §§ 1º e 7º do art. 39 (2); do § 2º do art. 41 (3); do art. 135 (4); do § 7º do art. 169 (5); e do inciso V do art. 206 (6) da Constituição Federal (CF). Também foi impugnado o art. 26 (7) da referida EC.
A ministra Cármen Lúcia (relatora), confirmando a cautelar anteriormente deferida, julgou parcialmente procedente o pedido formulado para declarar a inconstitucionalidade formal do caput do art. 39 da CF, bem como prejudicado o pleito quanto ao art. 26 da EC 19/1998.
A relatora afirmou que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) se consolidou no sentido da possibilidade de invalidação de emendas constitucionais nas hipóteses de ultraje aos limites insculpidos no art. 60 da CF.
Observou que, no caso, quando da tramitação de Substitutivo da Proposta da Emenda Constitucional 173/1995, o bloco de oposição apresentou pedido para votação em separado das alterações apresentadas para as normas que extinguiam a previsão constitucional originária do regime jurídico único, instituindo o contrato de emprego público. O pedido objetivava, expressamente, “manter a regra atual do regime jurídico único, alcançando todos os servidores da Administração Pública direta, autárquica e fundacional, bem assim preservar a permissão de contratação temporária por excepcional interesse público”.
Ao ser submetido à votação pelo Plenário da Câmara dos Deputados, o Substitutivo foi aprovado, ressalvados os destaques, com 309 votos favoráveis, 147 votos contrários e 18 abstenções. Os dispositivos destacados, objeto do DVS 9 (que extinguiam o regime jurídico único), não obtiveram três quintos dos votos pela aprovação (308 votos), contando com 298 votos favoráveis, 142 votos contrários e 8 abstenções. Rejeitadas, conforme proclamado pelo então Presidente da Câmara dos Deputados, as alterações propostas para o inciso IX do art. 37, para o caput do art. 39 e para o § 3º do art. 114 da CF. As normas objeto do DVS 9 foram rejeitadas e suprimidas do texto da Proposta de Emenda Constitucional, pelo que não poderiam ter sido submetidas à votação em 2º turno.
Assim, o não atingimento do quórum de votação para promover as alterações propostas no Substitutivo aos arts. 37, inciso IX; 39, caput, e 114, § 3º, da CF, configurou inequívoca manifestação do Plenário da Câmara dos Deputados, no sentido da rejeição da proposta de extinção do regime jurídico único da Administração Pública direta, das autarquias e das fundações públicas que até então vigia por determinação da norma original do art. 39 da CF.
No entanto, após a votação em 1º turno, o relator do projeto na Comissão Especial, alterou a redação final do Substitutivo transferindo o conteúdo da proposta contida no § 2º para o caput do art. 39 da CF.
Dessa forma, submeteu-se a um segundo turno de votação matéria rejeitada no primeiro, burlando-se, com isso, o requisito constitucional de aprovação das emendas constitucionais por três quintos dos votos dos membros de cada Casa, em dois turnos de votação.
A supressão da norma originária do caput do art. 39 da CF afrontou inequívoca manifestação do Plenário da Câmara dos Deputados que, em 1º turno de votação, rejeitara a mudança pretendida, desrespeitando, assim, o procedimento formal de reforma constitucional, contrariamente à sua supremacia e rigidez. A manobra parlamentar, levada a efeito em segundo turno de votação, descumpriu o § 2º do art. 60 da CF, que exige dupla aprovação por três quintos dos membros da Câmara dos Deputados de proposta de emenda constitucional.
A ministra ressaltou, ainda, a vedação do § 5º do art. 60, segundo o qual “a matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa”.
Nesses termos, caracterizada a inconstitucionalidade formal do caput do art. 39 da CF, na forma da EC 19/98, é de se declarar a nulidade da norma, restabelecendo-se a anterior, na forma que concluiu o Plenário no julgamento do pleito de cautelar.
Por outro lado, a relatora rejeitou as alegações de existência de inconstitucionalidades formais na (a) alteração da expressão “qualidade do serviço prestado” pela palavra “eficiência”, no caput do art. 37; (b) substituição da expressão “política remuneratória” por “sistema remuneratório”, no § 1º do art. 39; (c) substituição da expressão “disciplinará a aplicação dos recursos orçamentários” pela expressão “disciplinará a aplicação de recursos orçamentários”, no § 7º do art. 39; (d) alteração da expressão “os critérios a serem obedecidos na efetivação da demissão do servidor” por “as normas gerais a serem obedecidas na demissão do servidor”, no § 7º do art. 169; e (e) alteração do singular para o plural da locução “plano de carreira” no inciso V do art. 206. Ponderou que a análise dos textos submetidos à votação na Câmara e no Senado não conduz à conclusão de ter havido alterações substanciais dos conteúdos normativos das referidas normas, tendo sido modificadas por emendas tipicamente redacionais, não haveno de se cogitar, por conseguinte, de inconstitucionalidade formal, conforme verificado no julgamento da medida cautelar.
No que tange às demais alegações, alterações promovidas nos art. 37, incisos X e XIII; art. 39, § 1º; art. 41, § 2º, e art. 135 da CF, esclareceu que a isonomia de vencimentos revela critério a ser observado pelo legislador na edição de leis nas quais se cuide de remuneração dos cargos públicos. A previsão da norma originária do art. 39, § 1º, da CF nunca garantiu aos servidores públicos direito à isonomia automática de vencimentos de cargos de atribuições iguais ou assemelhadas aos por eles ocupados. E o art. 37, inciso XIII, veda a vinculação ou equiparação de espécies remuneratórias para efeito de remuneração de pessoal do serviço público. A supressão nos arts. 37, inciso XIII, e 135 da CF, da remissão originariamente feita ao art. 39, § 1º, da CF é consequência da alteração promovida nessa norma pela EC 19/1998, não importando também infringência ao princípio da isonomia. Ademais, a jurisprudência do STF é pacífica quanto à inexistência de direito adquirido a regime jurídico.
A alteração do § 2º do art. 41 do Substitutivo, pela qual se incluiu a condicionante “se estável” para a recondução ao cargo de origem, não promoveu mudança no sentido da proposição jurídica. A mencionada condicionante não contraria direitos e/ou garantias individuais (art. 60, § 4º, IV, da CF). Ao contrário, ela está harmonizada com a estabilidade no serviço público. Tem-se, portanto, a um só tempo, o fortalecimento do instituto da estabilidade e a confirmação, na relação estatutária (não contratual) entre servidor e Administração Pública.
Por fim, a ministra Cármen Lúcia reafirmou a prejudicialidade do capítulo relativo ao art. 26 da EC 19/1998, já pronunciado no julgamento da cautelar.
Em seguida, o julgamento foi suspenso.
(1) CF: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (…) X – a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices; (…) XIII – é vedada a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público;”
(2) CF: “Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão conselho de política de administração e remuneração de pessoal, integrado por servidores designados pelos respectivos Poderes. § 1º A fixação dos padrões de vencimento e dos demais componentes do sistema remuneratório observará: I – a natureza, o grau de responsabilidade e a complexidade dos cargos componentes de cada carreira; II – os requisitos para a investidura; III – as peculiaridades dos cargos. (…) § 7º Lei da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios disciplinará a aplicação de recursos orçamentários provenientes da economia com despesas correntes em cada órgão, autarquia e fundação, para aplicação no desenvolvimento de programas de qualidade e produtividade, treinamento e desenvolvimento, modernização, reaparelhamento e racionalização do serviço público, inclusive sob a forma de adicional ou prêmio de produtividade.”
(3) CF: “Art. 41 (…) § 2º Invalidada por sentença judicial a demissão do servidor estável, será ele reintegrado, e o eventual ocupante da vaga, se estável, reconduzido ao cargo de origem, sem direito a indenização, aproveitado em outro cargo ou posto em disponibilidade com remuneração proporcional ao tempo de serviço.”
(4) CF: “Art. 135. Os servidores integrantes das carreiras disciplinadas nas Seções II e III deste Capítulo serão remunerados na forma do art. 39, § 4º.”
(5) CF: “Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar. (…) § 7º Lei federal disporá sobre as normas gerais a serem obedecidas na efetivação do disposto no § 4º.”
(6) CF: “Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios. (…) V – valorização dos profissionais do ensino, garantidos, na forma da lei, planos de carreira para o magistério público, com piso salarial profissional e ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos;”
(7) EC 19/1998: “Art. 26. No prazo de dois anos da promulgação desta Emenda, as entidades da administração indireta terão seus estatutos revistos quanto à respectiva natureza jurídica, tendo em conta a finalidade e as competências efetivamente executadas.” STF, Plenário, ADI 2135/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 3.9.2020. Informativo STF nº 989.

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