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VALOR ECONÔMICO: PROJETO ELIMINA O QUOCIENTE ELEITORAL

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31 de janeiro, 2011

 
A presidente Dilma Rousseff retrocedeu na pretensão de aprovar uma reforma política enviada pelo Executivo, mas mudanças no sistema eleitoral brasileiro continuam mobilizando os partidos e devem entrar na pauta da legislatura que se inicia a partir de amanhã.
 
A novidade é que ganha força no Congresso a proposta de emenda constitucional (PEC), de autoria do senador Francisco Dornelles (PP-RJ), apelidada de “distritão”.
 
O projeto foi apresentado em 2007, na esteira da polêmica votação sobre o assunto – que derrotou a lista fechada – e começou a germinar aos poucos, a ponto de agora ser abraçado como modelo preferido da cúpula do PMDB. O vice-presidente Michel Temer já demonstrou entusiasmo pela ideia. O vice-líder do partido na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), é um defensor ferrenho.
 
Embora possa parecer simples e lógico – como a relação de aprovados num vestibular – o distritão seria um raríssimo sistema eleitoral. Enquanto o modelo clássico de voto distrital – predominante nos países anglo-saxões – elege apenas um representante por circunscrição, o distritão elegeria quantos deputados ou vereadores os Estados e os municípios tiverem.
 
Em São Paulo, por exemplo, na eleição para a Câmara, ganhariam vaga os 70 candidatos mais votados – independentemente do total alcançado pelo partido ou coligação.
 
Essa seria a principal diferença para o modelo atual, em que o primeiro critério de distribuição das cadeiras leva em conta a votação proporcional dos partidos e coligações, medida pelo quociente eleitoral.
 
O maior objetivo da proposta é acabar com a chance de um candidato bem votado ficar de fora enquanto outro, de baixa votação, se elege devido ao quociente eleitoral alcançado pelo partido detentor de grandes puxadores.
 
O caso mais radical dessa distorção ocorreu em 2002, quando cinco candidatos do Prona chegaram à Câmara com votação pífia – quatro deles com menos de 673 votos – graças à marca extraordinária de Enéas Carneiro: 1.573.642 votos.
 
Essa possibilidade não existiria no distritão. Os votos passariam a ser apenas dos candidatos. Isso, no entanto, poderia tornar o sistema mais personalista. O modelo, que caiu no gosto de líderes do PMDB, está no extremo oposto ao que o PT insiste em aprovar – a lista fechada, pela qual os eleitores votariam só em partidos e não mais em candidatos.
 
Eduardo Cunha argumenta que o sistema não é necessariamente incompatível com o fortalecimento dos partidos. “Basta aprovar mecanismos de fidelidade partidária”, afirma Cunha, embora ele mesmo tenha sido autor de uma proposta, em 2009, que previa a redução do prazo mínimo de filiação partidária de um ano para seis meses, exigido dos candidatos nas eleições.
 
Para o deputado, uma das principais vantagens do distritão seria o enxugamento do número de candidatos. “Não vou lançar mais candidatos de 2 ou 3 mil votos. É muito desgastante para o dirigente do partido ter de ficar à procura de pessoas sem qualquer expressão política e incluí-las na lista apenas para crescer o bolo de votos”, diz.
 
Eduardo Cunha considera que a primazia do critério partidário na distribuição das cadeiras, como é hoje, não fortalece as legendas porque seria artificial. O mecanismo de agregar votos em torno do partido estaria baseado nessa cooptação de candidatos sem vínculos com a agremiação. “Se você quer linha partidária vai para a lista fechada. Mas aí o primeiro nome da lista será o da mulher do líder do partido; o segundo, o do filho dele; o terceiro, o do sobrinho; e assim por diante”, critica.
 
O deputado – conhecido pelos imbróglios em negociações de cargos – afirma que “ninguém vota em mim porque estou no PMDB, mas porque são meus eleitores”.
 
Autor da proposta, Dornelles considera que o sistema “nem fortalece, nem enfraquece” os partidos, mas sugere em seguida que a tendência seria mais de fortalecimento, por meio da redução do quadro partidário.
 
A lógica, argumenta o senador, é que o distritão acabaria automaticamente com as coligações, pois as tornariam sem sentido. Com a disputa baseada apenas nos votos dos candidatos, não haveria necessidade de os partidos ultrapassarem o quociente eleitoral. Como as coligações são, essencialmente, trampolins para que legendas nanicas superem o quociente e consigam emplacar seus candidatos, elas ficariam desamparadas, extinguindo-se naturalmente.
 
Inversamente, o distritão poderia gerar incentivos à fragmentação partidária, já que um político poderia abrir sua própria sigla e obter o mandato exclusivamente com seus votos. Dornelles discorda: “Ele não mudaria para um partido pequeno porque não teria direito a comissão, voto de liderança, relatoria. Um político de expressão eleitoral só recorre à legenda pequena em último caso.”
 
Sobre a origem da ideia do distritão, o senador afirma que sempre foi um entusiasta do voto distrital clássico, uninominal, que elege um representante por circunscrição. Mas como a criação de pequenos distritos seria muito complexa, imaginou um modelo que aproveitasse os distritos brasileiros como eles já são – coincidindo com os Estados (nas eleições para deputados) e com os municípios (vereadores). “O distrital puro causaria divergências enormes, não haveria consenso”, afirma Dornelles.
 
O senador do PP admite que sua proposta é mais uma rejeição ao sistema proporcional em vigor no Brasil há décadas do que um modelo de preferência. “E porque só temos debatido o sistema de lista fechada, ao qual sou totalmente contrário”, diz.
 
Para integrantes do PT, a adesão ao distritão é vista como uma reação que pretende prejudicar os partidos de esquerda. “Precisamos fazer um diálogo com o PMDB, porque parte dele sempre foi a favor da lista fechada”, afirma Paulo Teixeira (SP), próximo líder da bancada do PT na Câmara, ao reconhecer que o apoio do aliado ao distritão dificulta as pretensões de seu partido.
 
Teixeira considera que “a reforma política é uma prioridade do país” e uma tarefa urgente do Parlamento. Ao citar uma pesquisa recente na qual 80% dos parlamentares do Congresso se disseram favoráveis à reforma, o deputado afirma que o próximo presidente da Câmara – o favorito, Marco Maia, é do PT – deve formar uma comissão especial para debater e votar o tema. “O ponto de partida poderia ser o projeto do governo de 2009. A bancada do PT está empenhada”, diz.
 
Paulo Teixeira ressalta que a reforma do sistema eleitoral deve vir acompanhada de uma reforma partidária, para consolidar um conjunto de normas que acabaram sendo criadas pelo Judiciário.
 
O petista critica o distritão por fortalecer muito a visão do voto pessoal. Essa característica, porém, é amenizada no mais novo projeto que embala integrantes do PSDB.
 
O partido – que sempre teve uma posição recalcitrante em relação ao tema e já apoiou o voto distrital, o distrital misto alemão e até a lista fechada do adversário PT – se empolga agora por um modelo que vem sendo chamado de “distritão misto”. Apresentado em 2009 pelos deputados paulistas Mendes Thame e Emanuel Fernandes, o projeto é uma espécie de mistura do modelo atual, proporcional, com o distritão de Francisco Dornelles. O objetivo é aproximar a relação entre os eleitos e seus eleitores. A ideia é que num Estado como São Paulo, que tem 70 deputados, fossem criados, por exemplo, 10 distritos de sete representantes, ou 14 que elegessem cinco cada.
 
“Resolveria uma distorção absurda. Em São Paulo, um deputado tem que se reportar a 30 milhões de pessoas, enquanto no Reino Unido ele responde a um eleitorado de 200 mil”, compara Mendes Thame.
 
Para o deputado, uma das vantagens de sua proposta em relação à PEC enviada pelo senador Dornelles, é que não mudaria o sistema brasileiro de proporcional para majoritário, o que implica mudança da Constituição e a difícil obtenção de uma maioria de dois terços.
 
“O nosso projeto é imensamente melhor, mais simples”, defende Thame, que não vê problema na complexidade de criação dos distritos, afirmando que ela se daria “apenas na primeira eleição”.
 
FONTE: VALOR ECONÔMICO – 31/01/2011