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VALOR ECONÔMICO: CRISE NO SUPREMO COLOCA EM RISCO JULGAMENTO DE PROCESSOS POLÊMICOS

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24 de abril, 2009

A troca pública de ofensas entre o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, e o ministro Joaquim Barbosa criou uma crise interna na Corte, levando à suspensão da sessão de julgamentos marcada para ontem. O clima no tribunal está pesadíssimo, é de impasse, e há total imprevisibilidade se o STF conseguirá concluir outros processos polêmicos em sua pauta, como a votação da Lei de Imprensa prevista para a semana que vem.
 
A situação poderia estar mais grave caso fosse aprovada uma nota de advertência nominal a Barbosa, na noite de anteontem, durante reunião reservada dos ministros com Gilmar Mendes, para analisar o ocorrido na sessão. A nota foi proposta pelo ministro Carlos Alberto Menezes Direito. A ideia chegou a ser endossada por outros ministros num primeiro momento por causa do tom pesado de Barbosa, que afirmou que Mendes estaria “destruindo a Justiça” no Brasil. O ministro Cezar Peluso chegou a apoiar essa nota mais dura citando Barbosa. Essa seria uma tentativa de corrigir os destemperos do colega de Corte que já teve embates e fez grosserias com quase a metade dos ministros do STF. Porém, outros ministros que estiveram na reunião defenderam a retirada do nome de Barbosa da nota. Eles avaliaram que isso significaria não apenas uma advertência ao colega, capaz de levá-lo ao isolamento total na Corte. Essa citação poderia ensejar um problema considerado mais grave: o início de um processo formal contra um ministro do STF.
 
Os ministros se preocuparam com o fato de que uma advertência nominal contra Barbosa poderia ser utilizada formalmente por qualquer pessoa para pedir no Senado a abertura de um processo de impeachment – algo inusitado e inédito na história do STF.
 
Segundo assessores do STF, os ministros Marco Aurélio Mello, Carlos Ayres Britto e Cármen Lúcia Antunes Rocha defenderam de maneira mais intensa a retirada de qualquer menção a Barbosa na nota. Mello fez a advertência de que a citação poderia ser utilizada formalmente num eventual processo. Segundo ele, seria um fato indesejado para o STF que levaria a uma crise ainda maior.
Britto e Cármen Lúcia disseram que o tribunal poderia buscar outra solução. Os ministros Celso de Mello, Ricardo Lewandowski e Eros Grau concordaram com essa ponderação. Foi neste contexto que os ministros do STF divulgaram uma nota de apoio a Mendes, reafirmando a “confiança e o respeito” a ele, e deixaram de mencionar Barbosa.
 
Ontem, Britto convidou Barbosa para almoçar e levou Lewandowski ao encontro. A ida de Lewandowski foi importante na tentativa interna do STF de superar a crise, pois ele é próximo de Direito – ministro que defendeu, num primeiro momento, uma advertência mais dura contra Barbosa. A avaliação é que ficaria até constrangedor, se apenas um ministro (no caso Britto) procurasse Barbosa no dia seguinte aos insultos que fez ao presidente da Corte.
 
Os três foram ao restaurante Universal, um local moderno e de boa comida. No almoço, Barbosa afirmou aos colegas que não se sentiu responsável pelo ocorrido e, por isso, não pretendia se desculpar com Mendes. Ele disse que foi provocado e apenas respondeu. Britto e Lewandowski insistiram para que fosse mantida, ao menos, a tradicional cordialidade da Corte entre ele e Mendes. Barbosa deu a entender que isso também depende de Mendes.
 
O presidente do STF informou os seus assessores que não pretende ingressar com qualquer ação contra Barbosa. Formalmente, ele poderia ingressar com uma queixa-crime, mas descartou essa hipótese por considerar que ela seria um fardo para todo o STF.
 
Mendes e Barbosa são contemporâneos. Ambos têm origem humilde, fizeram a mesma faculdade de Direito (na Universidade de Brasília), prestaram o mesmo concurso público (para o Ministério Público) e nunca se entenderam. Mendes acha Barbosa fraco para o STF, o que deixa esse último indignado.
 
O bate-boca se deu após Mendes fazer uma provocação litúrgica a Barbosa. Os ministros debatiam um tema novo no tribunal: se é possível modular os efeitos de uma decisão num tipo de recurso específico chamado “embargos de declaração”. A técnica de modulação dos efeitos faz parte das inovações recentes do STF. Por ela, o tribunal diz a partir de qual momento a decisão será aplicada. Os embargos de declaração são utilizados quando alguém recorre ao STF para que o tribunal esclareça supostas obscuridades ou omissões em suas decisões. Na ocasião, os ministros julgavam embargos do governo do Paraná contra lei que trata da previdência estadual.
 
A divergência teve início porque Mendes concluiu que o STF pode modular os efeitos de uma determinada decisão, mesmo após verificar que não houve omissão. Já Barbosa alegou que não se pode modular decisões em embargos, pois isso criaria instabilidade com relação às decisões da Corte. São posições antagônicas entre os ministros que já levaram a outro bate-boca. Em setembro de 2007, Mendes quis modular os efeitos num processo em que Barbosa fora o relator e que já estava decidido. Naquela ocasião, Barbosa disse que Mendes estaria usando um “jeitinho” para ressuscitar uma causa já decidida. “Precisamos acabar com isso”, falou Barbosa, suscitando a ira do colega. Ao fim, os demais ministros concordaram em fazer a modulação, após duras discussões.
 
Neste novo embate, Mendes começou ironizando o fato de Barbosa não estar no início do julgamento do caso do Paraná. Barbosa respondeu que estava sob licença médica devido a dores constantes nas costas. Em seguida, ele fez acusações a Mendes, consideradas graves pelos demais ministros. Falou que Mendes estaria destruindo a credibilidade da Justiça e disse que não era um “capanga do Mato Grosso”, uma alusão ao Estado natal do presidente do STF. Mendes preferiu por fim à discussão e encerrou a sessão.
 
Barbosa já se desentendeu com Mello e Eros Grau no STF e com os ministros Felix Fischer e Arnaldo Versiani no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ele não recebe advogados em seu gabinete, o que, de certa forma, o isolou na classe jurídica. Barbosa chegou a taxar de “tráfico de influência” alguns pedidos de advogados para que ele os receba antes de determinados julgamentos, como é comum em todos os tribunais.
 
Ontem, Mendes completou um ano na presidência do STF e o embate com um ministro da Corte apagou uma conquista recente do Supremo que, desde a presidência de Nelson Jobim, vem se expondo mais nos julgamentos, com a prática do chamado ativismo jurídico. Neste período de um ano, os ministros receberam 41% a menos processos – um recorde, pois o número vinha aumentando aos milhares ano a ano, o que estava tornando inviável a realização dos julgamentos. Questionado sobre o episódio, Mendes disse que não há crise no STF. “Não há crise. Não há arranhão. O tribunal tem trabalhado muito bem.”
 
A ministra Ellen Grace, que antecedeu Mendes na presidência do Supremo, evitou comentários. Ela está em Genebra fazendo campanha para o Órgão de Apelação da OMC, espécie de corte suprema do comércio internacional. Ela evitou jornalistas, tanto para não falar sobre o Supremo, como para não causar ruídos na campanha na OMC.
 
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em Buenos Aires, disse que está longe de ser uma crise institucional. “Se esse tipo briga ajuda a democracia, muito bem. Mas acho que quando ocupamos determinadas funções, é preciso que digamos (o que temos a dizer) dentro dos autos do processo, não pela imprensa”.
 
Fonte: Jornal Valor Econômico

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