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Servidor público. Adicionais de insalubridade e de periculosidade. Alteração da base de cálculo.

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23 de setembro, 2025

Servidor público. Adicionais de insalubridade e de periculosidade. Alteração da base de cálculo. Redução comprovada da remuneração. Princípio da irredutibilidade de vencimentos. Violação.
Cinge-se a controvérsia em saber se, quando há mudança da forma de calcular os adicionais de insalubridade e de periculosidade dos servidores, reduzindo-se o valor total que eles recebem, haveria violação à garantia constitucional de que a remuneração do servidor público não pode ser diminuída.
Inicialmente, ressalta-se que há distinção fundamental entre duas situações envolvendo verbas de natureza propter laborem, quais sejam, nas quais ocorram: extinção da causa determinante versus redução artificial do quantum remuneratório.
A primeira situação refere-se aos casos em que as condições fático-jurídicas que fundamentam a percepção da verba propter laborem efetivamente cessam. Nesta primeira hipótese, a extinção da rubrica constitui verdadeira imposição do princípio da legalidade, pois, em caráter exemplificativo, seria logicamente contraditório exigir o pagamento de adicional de insalubridade quando não há mais insalubridade, ou de adicional de periculosidade quando cessou a situação de perigo.
A extinção da causa determina, necessariamente, a extinção do efeito, sem que tal circunstância configure violação ao princípio da irredutibilidade de vencimentos, precisamente porque não há redução propriamente dita, mas, sim, adequação da remuneração à nova realidade fática do exercício funcional.
Efetivamente, “esta Corte orienta-se no sentido de que ‘as vantagens pecuniárias de natureza propter laborem remuneram o servidor público em caráter precário e transitório e por isso não se incorporam a seus vencimentos nem geram direito subjetivo à continuidade de sua percepção na aposentadoria, podendo ser reduzidas ou até mesmo suprimidas sem que se tenha violação ao princípio da irredutibilidade dos vencimentos’ (RMS n. 37.941/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 4/2/2013)” (AgInt no RMS n. 47.128/PR, rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 21/3/2017, DJe de 3/4/2017).
Contudo, situação diversa se configura quando o servidor mantém inalteradas todas as condições que justificam a percepção da verba propter laborem – permanecendo exposto aos mesmos riscos, exercendo idênticas atribuições e submetido às mesmas circunstâncias extraordinárias de trabalho etc. -, mas passa a receber valor monetário inferior em razão de alteração legislativa na forma de cálculo da vantagem.
Nesta segunda hipótese, não se constata nenhuma modificação no elemento causal que fundamenta a percepção da verba, mas apenas uma redução artificial do quantum remuneratório fundado no emprego de manipulação dos critérios de cálculo.
Consequentemente, a primeira situação não configura redução de vencimentos, mas, sim, adequação lógica entre causa e efeito, ao passo que a segunda caracteriza inequívoca diminuição do patrimônio remuneratório do servidor quando a modificação do cálculo da rubrica (adicional, gratificação, parcela etc) implica redução nominal da remuneração do agente público.
O próprio Superior Tribunal de Justiça há muito reconheceu esta distinção fundamental, ao decidir: “desde que não implique redução de vencimentos, a mudança da base de cálculo do adicional de insalubridade não representa ofensa a direito adquirido”, mas, “na espécie, todavia, a alteração acarretou decesso remuneratório aos recorrentes, pelo que é devido pagamento da diferença salarial resultante” (REsp n. 379.517/PR, rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, julgado em 6/6/2006, DJ de 26/6/2006, p. 185)
Essa decisão paradigmática evidencia que o critério determinante não é a natureza propter laborem da verba em si considerada, porém a ocorrência ou não de efetiva redução remuneratória.
No mesmo sentido, o STJ já assentou: “a mudança da base de cálculo do adicional de insalubridade não representa ofensa a direito adquirido, sendo legítima, desde que não implique redução de vencimentos do servidor público” (RMS n.36.117/RO, relator Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 26/4/2013, DJe de 16/4/2013), ratificando, portanto, que a legitimidade da alteração condiciona-se à preservação do valor nominal da remuneração.
Dessa forma, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça não apresenta contradição alguma, e, sim, coerente diferenciação entre situações juridicamente distintas: quando há extinção da causa que justifica a percepção da verba propter laborem, sua supressão é legítima porque desaparece o próprio fundamento para sua existência. Todavia, quando persiste a causa, mas reduz-se artificialmente o valor por meio de alteração dos critérios de cálculo, reduzindo a remuneração, configura-se violação indireta ao princípio da irredutibilidade de vencimentos, exigindo-se a compensação da diferença para preservar a integralidade remuneratória. STJ, 1ªT., RMS 72.765-RO, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 19/8/2025. STJ Informativo nº 861.