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Pesquisa da Fiocruz comprova a subnotificação das mortes de profissionais da saúde na pandemia

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02 de setembro, 2021

Dados do estudo mostram que pouco mais da metade desses profissionais, 53,8%, obteve treinamento para o uso adequado de EPI

Amparado em indicadores extraídos do Sistema de Informação de Mortalidade e do Sistema de Informação da Vigilância Epidemiológica da Gripe, o Ministério da Saúde confirmou a morte de 470 profissionais da saúde por Covid-19 até 1º de março de 2021. À época, o Conselho Federal de Medicina e o Conselho de Enfermagem alertaram que o número estava claramente subnotificado, até porque o campo referente à ocupação das vítimas não era de preenchimento obrigatório nessas duas bases de dados. Pelos cálculos das entidades, ao menos 1.197 médicos, enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem morreram em decorrência do Coronavírus até aquele momento, uma morte a cada 7 horas e meia.

Passados cinco meses, um inquérito da Fundação Oswaldo Cruz sobre a mortalidade de profissionais da saúde na pandemia confirma que as associações de classe estavam muito mais próximas da realidade que o governo. De acordo com a pesquisa coordenada por Eleny Guimarães Teixeira, doutora em Clínica Médica pela UFRJ, e Maria Helena Machado, doutora em Sociologia pela Uerj, 622 médicos, 200 enfermeiros e 470 auxiliares e técnicos em enfermagem morreram em decorrência do Coronavírus entre abril de 2020 e março de 2021 – 1.292 óbitos no total.

“Na linha de frente da batalha contra a Covid, muitos tombaram pelo caminho. E isso ocorreu porque não lhes foram dadas as condições mínimas de trabalho e segurança. A falta de equipamentos de proteção individuais, de capacitação profissional para lidar com uma doença altamente transmissível e a excessiva carga de trabalho levaram milhares de trabalhadores ao adoecimento físico e mental e os expôs ao risco evitável de morrerem em função da atividade profissional que exercem”, escreveu o ex-ministro Arthur Chioro, professor do Departamento de Medicina Preventiva da Unifesp, ao apresentar dados preliminares do estudo em sua coluna, publicada na edição 1168 de CartaCapital. “O que vimos foi um massacre.”

Dados da pesquisa mostram que pouco mais da metade desses profissionais, 53,8%, obteve treinamento para o uso adequado de EPI, enquanto 45,3% não tiveram orientação alguma ou buscaram informações em vídeos na internet ou com colegas, que ensinavam aquilo que sabiam. “Na saúde, mais que em outros setores, a educação permanente é indispensável e pode salvar vidas”, afirma Machado. Além disso, a carga de trabalho da maioria desses profissionais girou em torno de 60 horas semanais. Muitos se submeteram a jornadas extenuantes para assegurar o atendimento de pacientes em picos de demanda ou para substituir colegas infectados. “Não tenho dúvidas de que essas situações, acrescidas da pressão por produtividade e do atendimento em grande escala, trazem consequências nefastas ao trabalhador, tanto na sua saúde física quanto na mental.”

Outro estudo da Fiocruz, ainda em fase de elaboração, procura verificar o impacto da pandemia sobre os chamados trabalhadores invisíveis da saúde. São motoristas de ambulância, vigilantes, sepultadores, operários da manutenção, cozinha e limpeza dos hospitais. Mais de 23 mil profissionais de 60 categorias responderam à pesquisa pela internet.

Em São Paulo, alguns profissionais chegaram a permanecer 36 horas em plantão, relata o presidente do Sindicato dos Médicos de São Paulo, Victor Vilela Dourado. Especialista em anestesiologia pela Santa Casa de Misericórdia, ele também critica a forma como muitos médicos foram contratados para reforçar a equipes do sistema público, sobretudo nos hospitais de campanha. Em vez de contratá-los diretamente muitos governos optaram por confiar a tarefa à iniciativa privada, por meio das Organizações Sociais (OSs). “Os profissionais eram contratados em regime de Pessoa Jurídica, sem quaisquer direitos sociais ou trabalhistas”, denuncia. “Uma vez contaminados, eram simplesmente dispensados do trabalho.”

Sob o pretexto de acelerar a contratação de médicos, estados e municípios preferiram encurtar o caminho por meio de convênios com as OSs. Estas, por sua vez, entregavam o recrutamento de profissionais a empresas “quarterizadas”, que não se preocuparam em testá-los ou vaciná-los. Na verdade, nem sequer houve monitoramento dos trabalhadores contaminados. Em muitas situações, acrescenta Dourado, médicos idosos ou com comorbidades que integram os chamados “grupos de risco”, viram-se obrigados a atuar linha de frente dos hospitais, mesmo sem ter tomado uma única dose da vacina. “Aceitavam ou ficavam desempregados.”

No Rio de Janeiro, os problemas se repetem. De acordo com Mônica Carris Armada, presidente do sindicato fluminense dos enfermeiros, a falta de EPIs foi uma das maiores dificuldades no início da pandemia, mas não só. Ela lembra de situações bizarras, como a decisão de uma unidade de saúde de proibir o uso de máscaras por alguns profissionais, em um primeiro momento, para não causar pânico na sociedade. “O pessoal da limpeza, os ascensoristas, os maqueiros, os motoristas de ambulâncias, as recepcionistas, todos ficaram proibidos de usar”, comenta. O descaso do Poder Público persiste. Recentemente, enfermeiros do Hospital Municipal Salgado Filho, no Rio, tiveram de comprar máscaras em lojas especializadas com recursos próprios, devido à escassez de equipamentos de proteção individual.

Antiga capital da República, a cidade do Rio herdou seis hospitais e três institutos federais. Não por acaso, a caótica gestão da pandemia pelo governo Bolsonaro cobrou um preço elevado da população carioca. Ministério da Saúde decidiu, por exemplo, desmontar a estrutura do Hospital de Bonsucesso, onde eram realizados transplantes e cirurgias de alta complexidade, para transformá-lo em unidade de atendimento exclusivo para Covid-19. Os pacientes com outras enfermidades foram transferidos para a unidade da Lagoa sem infraestrutura adequada para a demanda. Não bastasse, um incêndio no Hospital de Bonsucesso comprometeu o atendimento dos próprios infectados pelo Coronavírus. “Ninguém sabe como ficaram os pacientes transplantados e transferidos”, diz Armada.

Insensível ao drama dos profissionais que atuaram na linha de frente da pandemia e ficaram permanentemente incapacitados para o trabalho pela Covid, Bolsonaro entrou, na terça-feira 24, com uma ação de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal contra a lei que obriga a União a indenizaçãomedida foi aprovada em março pelo Congresso Nacional, que derrubou o veto do Executivo e manteve previsão de reparações de até 50 mil reais. Segundo o governo, a compensação financeira coloca em risco o cumprimento das metas fiscais dos próximos anos.

Fonte: Carta Capital

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