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O equívoco dos “filósofos” sobre a Previdência, Rodolfo Fonseca dos Santos, 03/04/2003 (DIAP)

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05 de abril, 2003

O equívoco dos “filósofos” sobre a PrevidênciaRodolfo Fonseca dos Santos, 03/04/2003Os filósofos costumam dizer que o “tempo” não existe. O ex-secretário de Previdência Social, Vinícius Carvalho Pinheiro, deve estar querendo dar uma de filósofo, sem sê-lo (pelo menos nunca demonstrou nenhum brilhantismo nessa área, para não citar as demais), pois num estudo que divulgou em matéria publicada pelo jornal O Estado de São Paulo, “compara” dados de 1998 dos países ricos com dados de 2002 do Brasil. São “apenas” 4 anos, mas o tempo não existe, dizem os filósofos. Esta é apenas uma entre as inúmeras incoerências cometidas por Vinícius Pinheiro a pretexto de afirmar que os países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) gastam menos com os aposentados do setor público do que o Brasil.Ou Vinícius não sabe, o que seria um absurdo para um “técnico”, ou o jornal ignora, pois “engoliu” os dados, que não se pode fazer comparações com dados agregados e com bases estatísticas diferentes. Não são especificados na matéria os diversos regimes de previdência que são objeto de comparação, por exemplo, e também não são expostas e tampouco analisadas as reformas de previdência pelas quais passaram esses países e a própria reforma que o Brasil realizou no período de tempo considerado. Aliás, nenhuma variável importante que dá consistência a uma pesquisa, ou estudo, e que faz com que ela se torne referência analítica, é levada em conta nesse tão “exaustivo” trabalho que teria sido feito pelo ex-secretário de Previdência Social que hoje se dedica a “embolar” dados com a finalidade de “comprovar” que o Brasil gasta muito com Previdência. Não se engane: se você perceber que um aposentado brasileiro enfrenta dificuldade para comprar remédios, por exemplo, pode ter certeza de que é mentira. E se você souber que um aposentado europeu está fazendo um cruzeiro pelo mundo, pode também ter certeza de que não é verdade: os “pobres” europeus vivem na maior “pindura”.Não é a primeira vez, nem será a última, provavelmente, que são “esquecidos” pequenos “detalhes” para comparar o Brasil com países ricos. Esquece-se sempre, no caso dos aposentados, por exemplo, que os trabalhadores brasileiros ganham muito menos e começam a trabalhar muitíssimo mais cedo do que os “pobrezinhos” dos europeus e americanos. E que não se pode nem comparar, nos dois casos, as condições de assistência à saúde, saneamento, habitação e outros inúmeros fatores que também compõem a renda, com a diferença de que nos países ricos esses gastos são parcial ou integralmente absorvidos pelo Estado, enquanto no Brasil o trabalhador tem que arcar com tudo isso, e mais um pouco. “Condições de vida”, assim, nunca são levados em consideração, nesses aparentemente “criteriosos” estudos. Tampouco são considerados os estágios de desenvolvimento social e econômico pelos quais os países citados já passaram, em comparação ao Brasil.O que é mais saboroso na matéria publicada no Estadão, no entanto, é a referência ao fato de que a OCDE reúne 30 países desenvolvidos “em defesa de regimes democráticos e economia de mercado”. Soa até como ironia compará-los com países como o Brasil, onde os fundos de previdência privada se esforçam para achatar os benefícios da previdência pública, exatamente com o objetivo de “reservar mercado”, compulsoriamente, para os interesses privados de quem, afinal, nunca pretendeu praticar democracia, e muito menos economia de mercado. O que nos parece evidente é que a falta de transparência do estudo não esconde a total intenção da defesa da privatização da previdência. Ora, para fazer esse tipo de defesa da privatização não seria necessário manipular dados, bastaria apenas ter convicção.O estudo, portanto, carece de consistência estatística e de exatidão econômica, e a base metodológica não nos é sequer mencionada, que dirá explicada. Trabalhar com dados agregados pressupõe que as fontes primárias sejam públicas e de fácil acesso, fato que o ex-secretário parece que não quis divulgar. Desejamos que o autor do estudo nos apresente a desagregação das informações de maneira que se possa efetivamente analisar o que foi feito e como foi feito.Mas “embolar” dados não é privilégio do ex-secretário. O atual ministro da Previdência, Ricardo Berzoini, também tem simpatia pela prática. A prova está no “Diagnóstico do sistema previdenciário brasileiro” divulgado exaustivamente pelo ministro e disponível no site do Ministério. Ao apresentar as projeções do suposto “déficit” a longo prazo, o documento compara os números com o Produto Interno Bruto (PIB) quando o assunto é a previdência dos trabalhadores da iniciativa privada, o INSS (pág. 30 do diagnóstico impresso diretamente do site). Quando se trata da previdência dos servidores públicos, são apresentados apenas os valores em bilhões (pág. 55) porque se a comparação fosse feita com o PIB, o ministro deve saber, o “déficit” diminuiria, ao contrário do que ocorre com o INSS. O Tesouro Nacional publica o “déficit” no documento intitulado Relatório Resumido da Execução Orçamentária. Em 2003, o gasto com a previdência dos trabalhadores da iniciativa privada será correspondente a 1,38% do PIB. Em 2033, subirá para 2,23%. Em relação à previdência dos servidores públicos federais, o resultado é decrescente. Em 2003, o “déficit” corresponderá a 0,99% do PIB; em 2037, cairá para 0,33%. Basta verificar as páginas 39, 40 e 41 do Relatório.O próprio Vinícius, em abril de 2002, quando ainda era secretário de Previdência Social, escreveu artigo mostrando a tendência de queda de necessidade de financiamento da previdência dos servidores públicos da União, incluindo os militares. “De uma forma geral, as necessidades de financiamento apresentam uma tendência de redução”, diz o texto. No gráfico divulgado, essa necessidade cai de menos de 2% do PIB em 2002 para um percentual inferior a 0,5%, em 2074.Rodolfo Fonseca dos Santos é presidente da ANFIP (Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Previdência Social).

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