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Militar: conversão em pecúnia de licença-especial não gozada e a prescrição do fundo de direito

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07 de outubro, 2021

Cuida-se de apelação cível contra sentença que declarou a prescrição de fundo de direito, nos autos da ação de procedimento comum, interposta por militar, que objetivava a conversão em pecúnia de 12 meses de licença-especial e de 61 dias de férias não gozadas.
Em síntese, o apelante ingressou na Aeronáutica no dia 1º de março de 1971 e foi transferido para a reserva remunerada em 19 de fevereiro de 2004, tendo adquirido, nesse período, 12 meses de licença-especial e 61 dias de férias que não foram usufruídos, ou tampouco computados para inatividade. Em 2019, requereu a conversão desses em pecúnia.
Em sede de primeiro grau, foi reconhecida a consumação da prescrição do fundo de direito, por transcorridos mais de cinco anos entre a transferência para inatividade e o requerimento aludido. Diante disso o processo foi extinto, com resolução do mérito, na forma do art. 487, II, do CP.
Em suas razões de apelação, requereu a reforma da decisão, sustentando a não ocorrência da perda de seu direito, uma vez que a possibilidade de tal demanda teria nascido apenas com o Despacho Decisório nº 2/GM-MD (Ministério da Defesa/Gabinete do Ministro), de 2018, o qual possibilitou a aludida conversão. Acrescentou, ainda, que a Administração Pública renunciou ao prazo prescricional.
Por fim, prequestionou a violação de determinados dispositivos: a) art. 5º, caput, I, da Constituição Federal/1988, por desrespeito ao princípio da igualdade, visto que, conforme alegara, a conversão em pecúnia só abrangeu alguns militares – os mais novos – em detrimento de outros, em idênticas condições, bem como do apelante em relação àqueles servidores e membros do STF, STJ, TST e MPF; b) art. 5º, II e 37, caput, da CRFB/88, por afronta ao princípio da legalidade, “uma vez que o Despacho Decisório nº 2/GM-MD, de 12/04/2018 e a Portaria Normativa nº 31/GMD, de 24/05/2018, criam, indevidamente, vedação ao direito de conversão em pecúnia das licenças-especiais a alguns militares, em clara ofensa aos dispositivos dos art. 189 e 191, ambos do Código Civil”; c) art. 93, IX, da Carta Magna, por desprezo à justificação idônea, dado que a fundamentação apoiou-se, supostamente, em dispositivo não incidente e em precedente não similar ao caso; d) art. 189 do Código Civil/2002, haja vista que se não existia o direito de os militares converterem em quantia recebida as licenças-especiais não gozadas até 2018, não haveria que se falar em prescrição; e e) art. 191 do Código Civil, em razão de que o ato administrativo da União Federal de reconhecer tal direito representaria renúncia à prescrição.
Em seu voto, o relator, desembargador federal Ricardo Perlingeiro, principiou tratando da suposta perda do direito. Nesse sentido, expôs que o Superior Tribunal de Justiça decidiu, quando do julgamento do REsp nº 1.251.993, sob o rito do art. 543-C do Código de Processo Civil, que a prescrição quinquenal “aplica-se às ações ajuizadas contra a Fazenda Pública, seja qual for a pretensão deduzida, em detrimento do prazo trienal contido do Código Civil de 2002”.
Apoiado noutra decisão da Corte Cidadã – também afetada sob a formalidade dos recursos repetitivos representativos de controvérsia –, afirmou que o termo inicial do prazo prescricional, do direito de pleitear a indenização referente à licença-prêmio, é a data da aposentadoria do servidor público, incluindo a classe militar, conforme julgados expostos do STJ e do TRF2.
Ademais, realçou que a Portaria Normativa do Ministério da Defesa nº 31/GM-MD, de 2018, enrijeceu a previsão do lustro prescricional para a efetivação de tal requerimento, contado da transferência do militar para inatividade, ou do rompimento de seu vínculo com a Força Singular, conforme esmiuçado no art. 14 da referida normativa. Em reforço, colacionou diversos precedentes desta corte.
Em conclusão, reiterou o entendimento do Tribunal da Cidadania, quanto ao prazo prescricional e o termo inicial, enfatizando que ambos afetam os militares.
Dessa forma, exibiu que o recorrente passou para a reserva remunerada em 2004 e demandou sua pretensão, somente, em 2019. Assim certificou que restaria evidente a ocorrência da prescrição.
Destarte, julgou despropositada, nesse cenário, a alegação de violação dos dispositivos legais e constitucionais mencionados.
Fixou honorários recursais no montante de 1% e negou provimento à apelação.
Em sede de divergência, o desembargador federal Aluísio Mendes expôs o entendimento do STJ, concernente ao início do prazo prescricional, consoante o já exposto pelo relator.
No entanto, frisou que, com a Portaria Normativa nº 31/GM-MD, foi reconhecida a possibilidade de conversão em pecúnia da licença-especial não usufruída, nem computada. E, apesar do teor do art. 14 do referido diploma: “Considera-se prescrito, nos termos do art. 1º do Decreto nº 20.910, de 06 de janeiro de 1932, o direito à indenização, de que trata esta Portaria Normativa, se o requerimento for feito mais de cinco anos após a data: I – de transferência do militar para a inatividade”, manifestou que se a Administração procede ao reconhecimento de um direito ao indivíduo, mesmo quando já transcorrido o prazo de prescrição quinquenal, restaria configurada a hipótese de renúncia à prescrição. Nesse diapasão, colacionou decisões de sua lavra, em sentido idêntico ao defendido.
Outrossim, ressaltou que, em hipótese semelhante, o Conselho Nacional do Ministério Público reconheceu o direito de seus membros e servidores à conversão, em pecúnia, da licença prêmio não gozada. E apontou, também, que o Supremo Tribunal Federal já entendeu como termo inicial do prazo prescricional a data do reconhecimento administrativo.
Destacou, ainda, que a 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região concebeu que a “superveniência da Portaria Normativa nº 31/GM-MD, em 24/05/2018, reconhecendo aos militares das Forças Armadas a possibilidade de conversão em pecúnia de licença especial não usufruída, nem computada para fins de inatividade, consubstancia renúncia à prescrição do fundo de direito, incidindo, na hipótese, a prescrição quinquenal das parcelas, contada retroativamente à data do ajuizamento da ação”. A corroborar sua tese, citou decisão da 5ª região, com percepção análoga.
Para mais, frisou que a não renúncia à prescrição violaria o princípio da isonomia, em virtude de tratamento desigual a determinados indivíduos em situações semelhantes, possibilitando a conversão para militares mais novos e a impedindo aos demais.
Considerando que a Portaria Normativa nº 3/GM-MD foi editada em maio de 2018 e que a ação foi ajuizada em setembro de 2019, afirmou ser descabido se falar em prescrição do fundo de direito.
De mais a mais, entendendo possível o julgamento da lide, pelo artigo 1.013, § 4º, do Código de Processo Civil, o julgador enfrentou o direito material.
Neste ponto, expôs que o art. 97, da Lei nº 6.880/1980 (Estatuto dos Militares), estabelece que a reserva remunerada, a pedido, será concedida ao militar com no mínimo 30 anos de serviço. Exibiu, também, que o art. 68, da mesma legislação – atualmente revogado – previa licença remunerada de seis meses aos militares, a cada período de 10 anos de efetivo serviço prestado.
Apontou que, in casu, o autor escolheu, através do “Termo de Opção”, a utilização da licença-especial adquirida e não gozada, para a contagem em dobro na passagem à inatividade, como cômputo dos anos de serviço. Todavia, esses períodos não foram usufruídos, tampouco influenciaram no tempo de serviço necessário para a reserva remunerada, tendo o recorrente servido, de fato, por 33 anos – com a contagem em dobro do período mencionado, totalizaria 35.
Deste modo, o desembargador evidenciou o entendimento do STF de que as licenças-prêmios não utilizadas, por rompimento do vínculo ou pela inatividade, deverão ser convertidas em indenização pecuniária, a impossibilitar o enriquecimento sem causa da Administração.
Por conseguinte, asseverou ser viável a conversão de tal período em pecúnia e destacou que a restrição desta possibilidade à circunstância do falecimento do militar – em razão de ter sido a única expressamente prevista pelo art. 33, da MP nº 2.215-10/2001 –, vai de encontro ao princípio da razoabilidade. Portanto, prosseguiu, tal prerrogativa deve ser aplicada também ao militar que passa à inatividade, sob pena de enriquecimento ilícito da Administração Pública.
Ademais, afirmou que, com o objetivo de evitar, também, o enriquecimento sem causa do militar, dever-se-ia, do montante decorrente da conversão das licenças especiais em pecúnia, realizar a compensação dos valores pagos a título de majoração do adicional de tempo de serviço. Colacionou, para tanto, julgados nesse sentido do Superior Tribunal de Justiça, do Superior Tribunal Militar e dos Tribunais Regionais Federais da 2ª e 4ª Regiões.
Finalmente, definiu que a sentença deveria ser reformada, para assegurar a conversão em pecúnia do período de licença-especial não usufruído, afastada a incidência do Imposto de Renda, sobre a verba e eventuais períodos computados para fins de adicional de tempo de serviço, compensando os valores já recebidos a esse propósito.
Aduziu que a correção monetária deveria ser aferida com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial e os juros moratórios – não se tratando de créditos oriundos de relação jurídico-tributária –, teriam de seguir o índice de remuneração da caderneta de popança. Seguindo, inverteu a condenação de honorários advocatícios. Dessarte, deu provimento à apelação, em voto que restou minoritário.
Inconformado com a decisão, o militar opôs embargos de declaração, com o propósito de sanar supostas omissões no acórdão, no tocante à existência de renúncia tácita à prescrição e à violação de dispositivos constitucionais e infraconstitucionais para fins recursais nas instâncias superiores.
Em seu voto, o desembargador federal Ricardo Perlingeiro asseverou não haver qualquer omissão ou contradição na decisão e que mera discordância de interpretação jurídica não justifica a oposição dos aclaratórios. Esclareceu, também, que o julgador não é compelido a enfrentar todos os pontos suscitados pela parte, senão aqueles que teriam o condão de infirmar a conclusão adotada na decisão. Acrescentando, afirmou que o propósito de prequestionamento não é suficiente para embasar o recurso, desta forma, desproveu-o.
Perante o exposto, a 5ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região decidiu, por maioria, negar provimento à apelação. E, à unanimidade, indeferir os embargos declaratórios, ambos nos termos dos votos do relator. TRF 2ªR., 5ª Turma Especializada, AC 5062964-08.2019.4.02.5101, Desembargador Federal RICARDO PERLINGEIRO, Decisão em 10/03/2021. INFOJUR Nº 241 – abril-junho/2021

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