Erro médico. Responsabilidade civil do estado. Nexo causal. Dano moral.
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17 de dezembro, 2014
Apelação cível. Erro médico. Responsabilidade civil do estado. Nexo causal. Dano moral. Juros de mora.
1. A doutrina e jurisprudência são pacíficas no sentido de que a responsabilidade do Estado por danos causados a terceiros, nos termos do § 6º do art. 37 da Constituição Federal, é objetiva, ou seja, independe da verificação de culpa ou dolo na conduta do agente, desde que a sua atuação esteja relacionada com o exercício da função pública na qual investido. Portanto, diante da responsabilidade objetiva do Estado, incumbe à demandante, tão somente, fazer prova da conduta lesiva, do dano e do nexo causal.
2. No caso dos autos, segundo as declarações da parte-autora, ela se submeteu a tratamento quimioterápico para leucemia no Complexo Hospitalar Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre desde o ano de 1996 até o final de 2003, ocasião em que lhe foi retirado o cateter que estava implantado para receber as medicações. No ano de 2004, passou a apresentar febres e dores abdominais, o que, posteriormente, se descobriria ter sido causado por parte do cateter (com 10 cm), utilizado no procedimento médico em questão, e que se encontrava alojado próximo ao seu coração (evento 21, INIC2 e INIC3). Até que fosse descoberta a origem da infecção, a autora passou por vários tratamentos médicos, internação no Hospital Três de Maio, bateria de exames, tratamento por 42 dias com antibióticos, sem resultado (evento 21, INIC3). Retornou ao Complexo Hospitalar da Santa Casa, onde efetuou, no decorrer do ano de 2005, diversos exames até a constatação, em 10.08.2005, da imagem do corpo estranho (evento 21, LAUDPERI12, pg. 12).
3. Com efeito, da análise dos fatos acima relatados, temos que a demandada Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre agiu com negligência ao deixar de averiguar, com maior precisão, os primeiros sintomas referidos pela autora, que, em razão disso, foi obrigada a suportar, por mais tempo do que o necessário, graves complicações decorrentes da infecção provocada pelo corpo estranho. Além disso, o fato da parte rompida, com cerca de 10cm, ter sido "deixada" no coração da autora decorre diretamente da negligência da equipe médica, pois não é aceitável que o rompimento da peça não fosse detectado imediatamente após sua utilização no tratamento de A.C.H.
4. Da mesma forma, verifica-se a presença do nexo causal entre a endocardite e o fragmento do cateter, não sendo possível afastá-lo pelas alegações da ré Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, no sentido de o que existe somente, é o registro em prontuário de colocação de um cateter, na data de 22.07.2005 (EVENTO 21 – PRONT27 – fls. 413 – BOLETIM DE SALA – Centro Cirúrgico, fls. 414 – FOLHA DE SALA e fls. 415 – DESCRIÇÃO CIRÚRGICA), onde a ruptura, desprendimento e/ou fragmentação do mesmo possivelmente aconteceu durante o seu uso no período da internação ocorrida de 20.07.2005 até 10.08.2005, o que é possível de correr nestes casos e com o uso deste tipo de material (evento 207, APELAÇÃO1, pg. 11-12 – grifos no original).
5. Demonstrado o dano, bem como o nexo causal existente entre o fato lesivo e a conduta adotada pelo hospital réu e pelos prepostos (médicos) da UFCSPA, surge para os demandados o dever de reparar o sofrimento experimentado pela parte-autora, nos termos do já referido § 6º do art. 37 da Constituição Federal.
6. Já no que diz respeito com o quantum indenizatório fixado para a reparação do erro médico, temos que o valor arbitrado pelo Juízo a quo (R$ 50.000,00) mostra-se plenamente adequado ao grau de culpa dos réus, ao porte financeiro das partes, à natureza punitiva e pedagógica da indenização, bem como às peculiaridades do caso concreto, estando, ademais, em consonância com o posicionamento adotado pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça em casos semelhantes.
7. No tocante aos juros de mora, a sentença deve ser parcialmente reformada, mantendo-se a parte que os fixa a partir do evento danoso, conforme a Súmula 54 do STJ, devendo, no entanto, ser aplicada a sistemática adotada pelo art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009, aplicando-se o índice oficial de atualização da caderneta de poupança.
8. Apelação da UFCSPA e remessa oficial parcialmente providas. Apelação da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre improvida. TRF4, AC Nº 5000239-76.2011.404.7115, 3ª T, Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, por unanimidade, juntado aos autos em 23.10.2014. Revista do TRF4 152.