logo wagner advogados
Há mais de 30 anos defendendo exclusivamente os trabalhadores | OAB/RS 1419
Presente em 12 estados.

Empresa Pública e Penhora de Bens (Transcrições)

Home / Informativos / Jurídico /

02 de outubro, 2002

RE 220.906-DF*RELATOR : MIN. MAURÍCIO CORRÊARelatório: A 8ª Junta de Conciliação e Julgamento do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região julgou procedente a reclamação trabalhista proposta pelo ora recorrido ISMAR JOSÉ DA COSTA contra a EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS – ECT.2.Elaborada a conta de liquidação, citou-se a requerida para que efetuasse o pagamento do quantum a que fora condenada, sob pena de penhora.3.A ECT, afirmando ser empresa pública federal criada pelo Decreto-lei nº 509, de 20 de março de 1969, com privilégios equivalentes aos da Fazenda Pública “em relação à imunidade tributária, direta ou indireta e impenhorabilidade de seus bens, rendas e serviços”, pediu ao juízo da execução que determinasse o recolhimento do mandado de citação e que outro fosse expedido em conformidade com o disposto nos artigos 730 e 731 do Código de Processo Civil. O pleito foi indeferido sob o argumento de que à requerida não se aplicava o preceito do artigo 100 da Constituição Federal.4.A decisão que rejeitou os embargos opostos à execução deu ensejo ao agravo de petição a que a Primeira Turma da Corte Regional negou provimento por entender que, nos termos do artigo 173, § 1º, da Constituição Federal, as empresas públicas sujeitam-se ao regime próprio das empresas privadas. 5.Inconformada, a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos protocolizou recurso de revista sustentando verificar-se divergência entre as Turmas do Tribunal Regional do Trabalho quanto ao privilégio da impenhorabilidade dos bens de empresas públicas. O recurso tivera negado o seguimento em face do Enunciado nº 266 do Tribunal Superior do Trabalho, segundo o qual “a admissibilidade do recurso de revista contra acórdão proferido em agravo de petição, na liquidação de sentença ou em processo incidente na execução, inclusive os embargos de terceiro, depende da demonstração inequívoca de violência direta à Constituição Federal”.6.Ao agravo de instrumento protocolizado contra essa decisão, negou-se provimento.7.Ainda não resignada, a agravante deduziu o presente recurso extraordinário, com fundamento no artigo 102, III, “a”, da Constituição Federal, no qual alega terem sido violados os artigos 5º, incisos II e LIV, 100 e 165, § 5º, todos da mesma Carta.8.Esclarece a recorrente que a sua pretensão cinge-se a que a requisição de seus débitos se faça por meio de precatório.9.Sustenta, ainda, que a teor do artigo 6º do Decreto-lei nº 509/69 não há como deixar de se observar o instituto do precatório (CF, artigos 100 e 165) e as normas processuais alusivas à execução contra a Fazenda Pública.10. O recurso foi admitido na origem e após processado subiu a esta Corte.11. O Ministério Público Federal, às fls. 73/76, opina pelo não-conhecimento do extraordinário.É o relatório.Voto: A recorrente é empresa pública criada pelo Decreto-Lei nº 509, de 10 de março de 1969, com capital constituído integralmente pela União Federal (art. 6º), gozando de privilégios equivalentes aos da Fazenda Pública.2.Preceitua o artigo 12 do Decreto-lei nº 509/69, verbis:”A ECT gozará de isenção de direitos de importação de materiais e equipamentos destinados aos seus serviços, dos privilégios concedidos à Fazenda Pública, quer em relação a imunidade tributária, direta ou indireta, impenhorabilidade de seus bens, rendas e serviços, quer no concernente a foro, prazos e custas processuais.”3. No caso sub examine trata-se de pessoa jurídica equiparada à Fazenda Pública, que explora serviço de competência da União (CF, artigo 21, X). 4.Assinalo que a Primeira Turma desta Corte já se manifestou sobre a matéria por ocasião do julgamento do RE nº 100.433-RJ, de que foi relator o eminente Ministro SYDNEY SANCHES, em acórdão assim ementado, verbis:”EMENTA: EXECUÇÃO FISCAL. Impenhorabilidade de bens de empresa pública (ECT) que explora serviço monopolizado (§ 3º do art. 170 da Constituição Federal – EC-01/69), reservado exclusivamente à União (art. 8º, inciso XII, da Constituição Federal – EC-01/69).Recurso extraordinário não conhecido.” (RTJ 113/786)5.Observo que o referido precedente foi julgado à luz da Carta pretérita (EC-01/69, artigos 8º, XII, e 170, § 3º). Contudo, a disciplina da matéria não foi alterada com a promulgação da Constituição de 1988, permanecendo íntegra a competênciada União Federal para manter o serviço postal e o Correio Aéreo Nacional (CF, artigo 21, X), bem como a regra para exploração de atividade econômica por empresa pública (CF, artigo 173, caput e § 1º).6.Dispõe o artigo 173, caput, da Carta Federal, que “ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei”. Em seu § 1º reza que “a empresa pública, a sociedade de economia mista e outras entidades que explorem atividade econômica sujeitam-se ao regime próprio das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas e tributárias”. Daí não há como se inferir que seja dispensável a expedição de precatórios nas execuções contra empresas públicas que exerçam atividade tipicamente estatal.7.Note-se que as empresas prestadoras de serviço público operam em setor próprio do Estado, no qual só podem atuar em decorrência de ato dele emanado. Assim, o fato de as empresas públicas, as sociedades de economia mista e outras entidades que explorem atividade econômica estarem sujeitas ao regime jurídico das empresas privadas não significa que a elas sejam equiparadas sem qualquer restrição. Veja-se, por exemplo, que, em face da norma constitucional, as empresas públicas somente podem admitir servidores mediante concurso público, vedada a acumulação de cargos. No entanto, tais limitações não se aplicam às empresas privadas.8.Há ainda que se indagar quanto ao alcance da expressão “que explorem atividade econômica…”, contida no artigo 173, § 1º, da Constituição Federal. Preleciona José Afonso da Silva, in “Curso de Direito Constitucional Positivo”, 12ª Edição, Revista, 1996, págs. 732 e seguintes, que o tema da atuação do Estado no domínio econômico exige prévia distinção entre serviços públicos, especialmente os de conteúdo econômico e social, e atividades econômicas. Enquanto a atividade econômica se desenvolve no regime da livre iniciativa sob a orientação de administradores privados, o serviço público, dada sua natureza estatal, sujeita-se ao regime jurídico do direito público. 9.Conclui o eminente jurista que “a exploração dos serviços públicos por empresa estatal não se subordina às limitações do art. 173, que nada tem com eles, sendo certo que a empresa estatal prestadora daqueles e outros serviços públicos pode assumir formas diversas, não necessariamente sob o regime jurídico próprio das empresas privadas”, já que somente por lei e não pela via contratual os serviços são outorgados às estatais (CF, artigo 37, XIX). Assim, não se aplicam às empresas públicas, às sociedades de economia mista e a outras entidades estatais ou paraestatais que explorem serviços públicos a restrição contida no artigo 173, § 1º, da Constituição Federal, isto é, a submissão ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas e tributárias, nem a vedação do gozo de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado (CF, artigo 173, § 2º).10. A interferência do Estado na ordem econômica está consagrada nos artigos 173 e 174 da Constituição Federal: o próprio Estado, em casos excepcionais, atua empresarialmente no setor, mediante pessoas jurídicas instituídas por lei para tal fim; o Estado, como agente normativo e regulador, fiscaliza, incentiva e planeja a atividade econômica.11. Desse modo, os princípios gerais que informam a distribuição de atividades entre o Estado e a iniciativa privada resultam dos princípios da participação estatal na economia e da subsidiariedade, em seus aspectos suplementar e complementar à iniciativa privada. 12. Em obediência a esses princípios a atividade econômica estatal exsurge nos serviços públicos, nos serviços públicos econômicos e nos de interesse geral, donde a possibilidade de o Estado (CF, artigo 173) monopolizar os serviços públicos específicos, os de interesse geral e ainda os econômicos, por motivo de segurança nacional ou relevante interesse coletivo. Vê-se, pois, que a legitimidade da participação do Estado na economia se fundamenta em três conceitos fundamentais: segurança nacional, serviço público econômico e interesse público. 13. A Constituição Federal, em seu artigo 173, cuida da exploração direta de atividade econômica pelo Estado. A respeito da matéria escreveu o constitucionalista CELSO RIBEIRO BASTOS que “por tais atividades deve entender-se toda função voltada à produção de bens e serviços, que possam ser vendidos no mercado, ressalvada aquela porção das referidas atividades que a própria Constituição já reservou como próprias do Estado, por tê-las definido como serviço público nos termos dos incisos XI e XII do artigo 21 do Texto Constitucional. Ou então quando forem reservadas a título de monopólio da União (CF, art. 177). Tal circunstância é que justifica a inserção da cláusula “ressalvados os casos previstos nesta Constituição” (Comentários à Constituição do Brasil, 7º v, p. 75). 14. Assim, a exploração de atividade econômica pela ECT -Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos não importa sujeição ao regime jurídico das empresas privadas, pois sua participação neste cenário está ressalvada pela primeira parte do artigo 173 da Constituição Federal (“Ressalvados os casos previstos nesta Constituição…”), por se tratar de serviço público mantido pela União Federal, pois seu orçamento, elaborado de acordo com as diretrizes fixadas pela Lei nº 4.320/64 e com as normas estabelecidas pela Lei nº 9.473/97 (Lei de Diretrizes Orçamentárias), é previamente aprovado pelo Ministério do Planejamento e Orçamento – Secretaria de Coordenação e Controle das Empresas Estatais, sendo sua receita constituída de subsídio do Tesouro Nacional, conforme extrato do Diário Oficial da União acostado à contra-capa destes autos. Logo, são impenhoráveis seus bens por pertencerem à entidade estatal mantenedora. Ante o exposto, tenho como recepcionado o Decreto-lei nº 509/69, que estendeu à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos os privilégios conferidos à Fazenda Pública, dentre eles o da impenhorabilidade de seus bens, rendas e serviços, devendo a execução fazer-se mediante precatório, sob pena de vulneração ao disposto no artigo 100 da Constituição de 1988. Por conseguinte, conheço do recurso extraordinário e dou-lhe provimento. acórdão pendente de publicação – Informativo 213

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

hostinger