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Em meio a desafios, transsexuais, indígenas, e quilombolas buscam mais espaço na União

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20 de março, 2025

Número de indígenas em cargos comissionados cresce, mas ausência de dados sobre trans e quilombolas preocupa especialistas

Embora as políticas afirmativas tenham avançado nos últimos anos, a inclusão de transsexuais, quilombolas e indígenas no funcionalismo público federal ainda enfrenta desafios estruturais. Segundo o entendimento dos especialistas, ainda há barreiras para entrada, permanência e ascensão desses grupos no setor público. Políticas afirmativas vêm sendo implementadas com o objetivo de ampliar a representatividade, tanto por meio de concursos quanto em posições de liderança.

Segundo Jessika Moreira, diretora-executiva do Movimento Pessoas à Frente, a representatividade desses grupos na administração pública é essencial para que as políticas públicas reflitam melhor a diversidade da população brasileira:

— A burocracia precisa ser um espelho da sociedade que atende. Quando há diversidade dentro do governo, as políticas públicas se tornam mais justas e efetivas.

Apesar disso, a especialista alerta que a diversidade não pode ser vista apenas como um número:

– A inclusão não pode se limitar ao ingresso. Muitas pessoas entram no serviço público, mas não encontram um ambiente acolhedor, enfrentam barreiras para crescer na carreira e acabam saindo. Precisamos garantir condições para que essas pessoas permaneçam e ascendam dentro da administração pública.

Jessika Moreira reforça que a diversidade no funcionalismo não é apenas uma questão de justiça social, mas também de eficiência administrativa:

– Pessoas iguais não resolvem problemas complexos. Quanto mais diversidade tivermos dentro da administração pública, mais inovadoras e eficazes serão as soluções para os desafios da sociedade brasileira.

Avanço de indígenas

De 2018 a 2025, o número de indígenas em cargos comissionados executivos e funções comissionadas executivas subiu de 305 para 422. Mas, no apanhado geral de vínculos estatutários com o funcionalismo público federal, o número flutuou de 3.396 em 2023 para 3.520 em 2025, tendo em 2024 o pico de 3.625.

O painel estatístico de pessoal do governo federal não aponta números anteriores a 2023, ano em que o governo Lula (PT) assumiu seu terceiro mandato.

Dados do estudo “Desigualdade de gênero em cargos de liderança no Executivo Federal”, conduzido pelo Movimento Pessoas à Frente, mostram que a população indígena ocupa cerca de 0,8% dos cargos de liderança no setor público, um percentual alinhado com sua presença na população. No entanto, a distribuição desses servidores ainda é desigual, concentrando-se em poucos órgãos, principalmente na Funai.

No entanto, a distribuição desses servidores ainda é desigual, concentrando-se em poucos órgãos.

Inclusão de transsexuais

Segundo dados da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), apenas 10% das pessoas trans no Brasil estão empregadas formalmente. Além disso, de acordo com a organização, o país mantém, pelo 14º ano consecutivo, a triste marca de liderar o ranking mundial de assassinatos de pessoas trans.

Faltam, no entanto, dados específicos sobre servidores trans no funcionalismo público, o que significa um entrave para o monitoramento do impacto dessas políticas.

O Sistema Integrado de Administração de Pessoal (Siape), que centraliza informações sobre os servidores do Executivo federal, não registra a identidade de gênero dos funcionários. Sem essas estatísticas, especialistas apontam que a avaliação da efetividade das políticas afirmativas fica comprometida.

Presença quilombola

O mesmo vale para os quilombolas. De acordo com o Censo de 2022, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o Brasil tem cerca de 1,3 milhão de pessoas que se autodeclaram quilombolas, representando aproximadamente 0,65% da população total do país.

Não há, no entanto, um monitoramento do número de quilombolas na administração pública, já que estão abarcados na categoria de negros, o que dificulta o rastreio.

Histórico da inclusão

O advogado especialista em Direito Administrativo Sergio Camargo ressalta que as políticas de inclusão no setor público começaram a ganhar força no Brasil a partir dos anos 2000, mais de uma década após a promulgação da Constituição de 1988.

Embora a Carta Magna tenha estabelecido princípios de igualdade e direitos fundamentais para todos os cidadãos, foi apenas com o início do novo milênio que medidas afirmativas voltadas a grupos historicamente marginalizados passaram a ser implementadas de forma mais ampla nos âmbitos federal, estadual e municipal.

— Se olharmos para a nossa trajetória recente, vemos que a Constituição de 1988 já previa a igualdade entre homens e mulheres no artigo 5º, mas demoramos mais de dez anos para começar a transformar isso em políticas públicas concretas — analisa Camargo.

Para Camargo, a inclusão no funcionalismo não pode se limitar à reserva de vagas, sendo necessário um esforço contínuo para garantir que os servidores transsexuais, quilombolas e indígenas tenham condições de permanecer e progredir na carreira pública.

— O Brasil avançou, mas ainda há muito a ser feito para que a diversidade dentro da administração pública não seja apenas um discurso, mas uma realidade consolidada.

Mudanças

Por outra via, não é possível negar os marcos desse processo de transformação. Um dos principais foi o lançamento do Programa Federal de Ações Afirmativas, que busca equiparar oportunidades para mulheres, negros, quilombolas, indígenas e pessoas com deficiência no serviço público.

Além disso, o Plano de Enfrentamento ao Assédio e à Discriminação na Administração Pública Federal, lançado em 2024, foi outra iniciativa relevante. O objetivo da medida é combater o assédio moral e sexual no ambiente de trabalho.

Formação de lideranças

Já o Programa LideraGov, voltado à formação de lideranças, incluiu a partir da segunda edição uma reserva de vagas para grupos sub-representados.

Atualmente, 4% das vagas são destinadas a quilombolas, 4% a indígenas e 4% a pessoas trans.

Ingresso diverso

No campo dos concursos públicos, houve mudanças. O governo elaborou um projeto de lei para alterar a Lei de Cotas vigente, ampliando a reserva de vagas de 20% para 30% e incluindo indígenas e quilombolas entre os beneficiários.

Além disso, foram criadas medidas para evitar o fracionamento dessas cotas e garantir maior segurança jurídica.

Indígenas: A Lei nº 14.724/2023, aprovada em novembro, determinou que concursos da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) reservem entre 10% e 30% das vagas para candidatos indígenas. No Concurso Público Nacional Unificado (CPNU), realizado em 2024, essa política resultou na reserva de 30% das vagas para esse grupo. Os primeiros números demonstram um avanço. Apesar de indígenas representarem apenas 0,46% dos inscritos no CPNU, 2,29% dos aprovados pertenciam a esse grupo, indicando um impacto positivo das ações afirmativas.

Transsexuais: A inclusão da população trans também avançou com a publicação da Instrução Normativa Conjunta MGI/MDHC nº 54/2024. A medida estabelece regras para garantir o respeito à identidade de gênero de candidatos trans em concursos públicos. O nome social deve ser utilizado em todas as etapas do certame, inclusive nos critérios alfabéticos de organização, evitando constrangimentos. Também está proibida a segregação de candidatos em salas especiais e exigências discriminatórias na identificação.

Quilombolas: Mudanças recentes no campo dos concursos públicos também contemplaram a inclusão de quilombolas como beneficiários das políticas de reserva de vagas. Com a ampliação das cotas de 20% para 30% e a inclusão explícita de quilombolas na Lei de Cotas, o governo busca reparar desigualdades históricas e promover a equidade no acesso ao serviço público.

Fonte: Extra (RJ)