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Em defesa das aposentadorias do setor público, Paulo Nogueira Batista Jr.

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23 de janeiro, 2003

Em defesa das aposentadorias do setor públicoPAULO NOGUEIRA BATISTA JR. Diversos leitores e amigos querem que eu responda hoje às grosserias que me foram endereçadas pelo ex-ministro Celso Lafer em artigo publicado nesta Folha (“Zurros e argumentos”, 16/01, pág. A3). Realmente, o ex-ministro perdeu as estribeiras. Chegou a referir-se a meus modestos escritos como “zurros”.O leitor gosta de sangue. Mas não vou responder. E explico: certa vez, durante acirrado debate com um sofista, Sócrates sofreu da parte do adversário violentos insultos e agressões. Não retrucou e retirou-se. Um jovem discípulo que o acompanhava indagou, consternado: “Mestre, por que não revidaste?”. Sócrates respondeu: “Se um jumento te dá um coice, tu revidas?”.Não quero, é claro, comparar-me a Sócrates. Ou o ex-ministro (e conhecido pensador) a um simples e prosaico jumento. Em todo o caso, vamos seguir o exemplo do grande filósofo.O jumento, diga-se de passagem, tem sido objeto das mais variadas divagações. Para Machado de Assis, por exemplo, o jumento não é propriamente um animal, mas “a imagem quadrúpede do homem”. A prova disso, dizia ele, é que, se encontramos a amizade no cão e o orgulho no cavalo, só no jumento encontramos a filosofia.Um jumento-filósofo? É possível. Mas esse emblemático animal dificilmente toma a forma e as atitudes características de um ex-ministro das Relações Exteriores. E vice-versa. Pode acontecer, mas é um fenômeno raro.Deixemos isso de lado. Gostaria de tratar um pouco de um dos temas que estão na ordem do dia: a reforma da Previdência Social. Por enquanto, o assunto tem sido abordado pelo governo e pela maior parte da imprensa de maneira bastante desequilibrada.Procura-se frequentemente induzir a opinião pública a acreditar que o problema da Previdência é decorrente dos privilégios do funcionalismo público. Vai se espalhando a avaliação de que o principal obstáculo a essa reforma fundamental é a “resistência corporativa” do funcionalismo, que tem a perder “com o fim dos privilégios que compõem o grosso do déficit e inviabilizam atuarialmente a Previdência”, observou editorial recente do jornal “O Estado de S.Paulo” (21/1. pág A3), vocalizando a opinião predominante em muitos círculos.Não há dúvida de que o problema é grave. O crescimento das despesas previdenciárias contribui para dificultar a sustentação dos superávits primários, que se tornaram indispensáveis como resultado da pesada herança fiscal-financeira deixada pelo governo Fernando Henrique Cardoso. Também não há dúvida de que existem abusos e privilégios no âmbito do setor público, que precisam ser explicados à sociedade brasileira e corrigidos na forma da lei.Mas a palavra “privilégio” tem sido utilizada de maneira abusiva. Parece difícil acreditar que a eliminação dos verdadeiros privilégios, corretamente identificados, possa ser suficiente para resolver o problema.Por exemplo, repete-se muito que os empregados públicos se aposentam com salário integral, enquanto os do setor privado só recebem do INSS até um certo limite (atualmente de R$ 1.561,56 por mês). Menos comentado é o fato de que os servidores funcionários públicos civis contribuem para a Previdência com uma alíquota de 11% sobre a totalidade dos seus salários, ao passo que os trabalhadores assalariados do setor privado pagam uma alíquota marginal máxima de 11% ao INSS até o mesmo teto de R$ 1.561,56.A tese muito repetida de que o grande responsável pelo problema previdenciário seria o sistema público, enquanto o INSS seria mais facilmente administrável, baseia-se frequentemente em cálculos nos quais o déficit da previdência pública é definido como a diferença entre os benefícios (aposentadorias e pensões) e as contribuições pagas pelos servidores.Poucas vezes se menciona o fato de que está faltando a contribuição do governo, como lembrou o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores da Receita Federal, Paulo Gil, em entrevista recente à Folha (19/1, pág. A6). No setor privado, o empregador contribui para a Previdência com 20% sobre o salário-base.Além disso, boa parte da arrecadação federal consiste de contribuições sociais -por exemplo, a Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social) ou a CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido)-, criadas para financiar a Seguridade Social, que é definida constitucionalmente como o conjunto das ações relativas à saúde, à previdência e à assistência social.O governo Lula estará cometendo grave erro se conduzir a questão previdenciária de modo afobado, com os olhos voltados para as medidas e reformas consideradas indispensáveis pelo chamado mercado, leia-se, pelo capital financeiro local e internacional.Nunca se deve perder de vista que o Estado nacional é uma abstração, que só se materializa plenamente pela ação do seu corpo de funcionários permanentes, que precisam ser motivados e tratados com justiça.Governos que começam desrespeitando e agredindo os interesses dos seus servidores nunca terminam bem.Paulo Nogueira Batista Jr., 47, economista, pesquisador visitante do Instituto de Estudos Avançados da USP e professor da FGV-EAESP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro “A Economia como Ela É…” (Boitempo Editorial, 3ª edição, 2002).E-mail – [email protected]

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