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Com ambientes adaptados, serviço público acolhe pessoas com deficiência

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24 de setembro, 2018

Passar em concurso, quase sempre, significa evitar preconceitos e resistência dos empregadores na hora da contratação. Para muitos, além do salário e da estabilidade, implica garantia de ambiente de trabalho adaptado às necessidades

Um mergulho no litoral paulista, às vésperas do réveillon de 2003, mudou radicalmente os rumos da vida de Danilo Oliveira Freire. Foi na Praia do Curral, em Ilhabela, que o então estudante de ensino médio bateu a cabeça em um banco de areia, lesionou a medula na altura da quinta vértebra e se tornou tetraplégico, perdendo totalmente o movimento das pernas e parte da força nos braços. “Eu soube no primeiro segundo o que tinha acontecido. Eu tinha 16 anos”, conta o hoje servidor público.

Danilo, no entanto, não parou. Continuou os estudos, fez faculdade e começou a atuar como advogado. No entanto, não estava totalmente satisfeito no escritório em que trabalhava. “A mobilidade interna era possível, mas não fácil. Eu tentei mudar, mas não consegui, o que acelerou o processo de estafa mental”, lembra. Foi quando a alternativa do serviço público começou a atrair o jovem.

Por ser formado em direito e ter trabalhado por vários anos como advogado, o paulistano escolheu o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) como meta e enfiou a cara nos livros. No dia da prova, contou com local de fácil acesso para cadeirantes, mesa separada da cadeira e auxílio para a transcrição do gabarito. “Uma dica preciosa é entrar em contato antes com a banca organizadora e conversar sobre o estacionamento”, aconselha. O tratamento adequado continuou depois da aprovação, sendo muito bem recebido pelas pessoas no órgão, apesar de o prédio do tribunal ainda ter o que melhorar em relação à acessibilidade.

A escolha pelo serviço público, porém, não poderia ter sido mais acertada, considera. “O concurso público é uma opção muito boa para a pessoa com deficiência no Brasil. Não só pela remuneração e estabilidade, mas, sobretudo, pela forma de acesso. Não é fácil passar, mas o fato de a contratação não depender do aval do contratante é positivo. Toda pessoa com deficiência sabe o quanto é difícil se inserir na iniciativa privada, por razões totalmente alheias à qualificação”, avalia Danilo, que considera a possibilidade de fazer outros concursos futuramente.

Drible no preconceito

Como Danilo, cada vez mais pessoas veem no serviço público a chance de obter uma vaga sem precisar enfrentar resistências e preconceitos dos empregadores. Segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), dos 8.591.446 servidores estatutários no país, 27.832 têm alguma deficiência — a maioria, 16.829 deles, física. Nos relatos desses profissionais, opiniões semelhantes à do servidor do TJSP.

“Como servidora, acho que as pessoas me respeitam mais e é mais fácil conseguir um ambiente de trabalho adaptado, como cadeira e mesas específicas”, afirma Débora Rocha, servidora do Ministério Público do Trabalho do DF e Territórios (MPDFT), por sinal, o órgão com mais servidores com deficiência no Brasil, com 785 trabalhadores. Em seguida, vem o TJSP, a Secretaria de Educação do Distrito Federal (SEE/DF), o Ministério Público Federal (MPF) e a Secretaria de Educação do Recife.

Débora sentiu os primeiros sintomas da artrite reumatoide juvenil (ARJ) aos 8 anos, quando os pés incharam a ponto de ela não conseguir calçar os sapatos para ir à escola. Com o tempo, a doença crônica afetou também mãos, punhos e cotovelos, mas não a disposição da jovem, hoje com 33 anos, para o trabalho e os estudos. Ela se formou em gestão pública e hoje estuda direito. E, antes de ser aprovada no primeiro concurso, trabalhou com telemarketing, atendimento ao público e serviço administrativo.

A legislação que obriga empresas maiores a reservar de 2% a 5% das vagas para funcionários reabilitados ou com deficiência a ajudou muito, mas o preconceito sempre foi um obstáculo. “Já deixei de conseguir vagas por ser deficiente. A gente acaba tendo que se superar para ser reconhecida. É o que chamamos de capacitismo. As pessoas acreditam que quem tem deficiência é inferior, não é capaz”, observa Débora, que está lotada na Promotoria da Pessoa com Deficiência. Lá, ela coordena um grupo de acessibilidade do MPDFT, que tem como objetivo conscientizar os servidores sobre a realidade das pessoas com deficiência.

Autoestima

O capacitismo mencionado por Débora é uma forma de preconceito bem familiar para Daniela Retori, que, devido a um erro do médico que fez seu parto, teve o crânio amassado e perdeu parte do cérebro. “Ele achatou meu cérebro, pescoço, rosto e minha cabeça. Fiquei em coma por 15 dias e preciso fazer fisioterapia desde os 5 meses”, conta a pedagoga, que tem duas graduações e três pós-graduações.

Mesmo sendo tão capacitada, Daniela foi preterida por várias escolas particulares por conta da paralisia cerebral. A saída para exercer a vocação de educadora acabou sendo o concurso da Secretaria de Educação do Distrito Federal (SEE/DF). “Primeiro, trabalhei por 20 anos em várias escolas e, desde 2007, estou no Centro de Ensino Especial 01. Quando passei no concurso público, tive certeza que queria continuar no CEE 01. A secretaria é uma mãe e, agora que me tornei efetiva, tenho mais tranquilidade para trabalhar e lidar com dificuldades, com as minhas limitações. Estou muito feliz”, comemora, com a confiança de quem nunca deixou sua condição física abalar sua confiança.

“Sofro bullying desde que nasci. Como as pessoas só percebem que tenho paralisia se me veem andar, acham que não quero fazer algumas coisas porque tenho preguiça. Outros, quando convivem comigo, têm pena, e isso eu não quero. Nunca tive baixa autoestima.”

Fonte: Correio Braziliense

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